domingo, 30 de setembro de 2001

Jornal Gazeta Mercantil/ Gourmet/ Perfil - 28, 29 e 30/09/2001

COGUMELOS AO SABOR DA ITÁLIA
Silvia Percussi coroa carreira de chef com o lançamento de um livro de receitas com fungos
Arnaldo Lorençato
de São Paulo
Muito antes de vestir o uniforme de chef, no final dos anos 80, a paulistana Silvia Percussi descobriu a sua paixão pelos cogumelos. Foi durante a infância, não exatamente na concreta São Paulo, mas na bucólica paisagem da região de Gênova. Era lá que quando garota costurmava passar férias e saborear os fungos frescos colhidos por seu pai entre as videiras e oliveiras da casa da família, em Sestre Levante. À frente da cozinha da Vinheria Percussi desde 1989, Silvia de 37 anos , pasou a colecionar e adatar receitas de cogumelos presenteadas por amigosu ou retiradas de livros ou revistas de gastronomia. Inicialmente, elas fariam parte apenas de um festival, promovido em 1991. O evento deu tão certo que se tornou anual.
Agora, 60 dessas delícias compõem "Funghi, Cozinhando com cogumelos", que vai ser lançado nesta segunda-feira, dia 1º de outubro, no próprio restaurante.
Nas 102 páginas, é possivel montar uma refeição completa - sem a sobremesa, naturalmente, com diferentes tipos de cogumelos encontrados no Brasil, usados com ingredientes principal ou coadjuvantes de pratos de fácil ou média dificuldade na execução. " Quis fazer um livro que as pessoas ralmente usassem. Não é para ficar na estante", diz a autora, com afinado senso de praticidade. Entre as entradas, há desde uma rústica bruschetta de porcini fresco a uma delicada salada de radicchio, endívia e cogumelos rosa. Shiitake dá alma para a polenta, enquanto o shimeje faz par perfeito com o saint pierre, receita que se encontra nesta página. Também há dicas práticas sobre como fazer cubos de gelo com a água da reidratação de cogumelos secos em outros pratos. A escritora novata só não se preocupou em incluir pratos com as trufas brancas de Alba. "Não valia a pena porque elas têm preços proibitivos". No pé de cada receita há uma sugestão de vinho escolhido pelo pai, Luciano Percussi.
A obra chega embalada ainda pela apresentação de dois amigos-clientes: o artista plástico Aldemir Martins e o fotógrafo Thomas Farkas, e projeto gráfico de Rafic Farah.
Se hoje silvia é uma profissional de cozinha de talento reconhecido por especialistas em gastronomia e pelo público que costuma lotar o pequeno restaurante de sua familia, ela nunca imaginou exercitar seus dotes culinários muito além do fogão doméstico.
"Quando era pequena, adorava ver minha mãe cozinhar, mas o máximo que fazia eram uns biscoitos. Sonhava em ser decoradora ou artista plástica".
Assim, depois ela acabou integrando uma das turma de Desenho Industrial, na Universidade Machenzie. Aproximação definitiva com o metiê culinário, porém, é o resultado de uma greve de ônibus em 1989. Para entender melhor essa história, é preciso voltar no tempo e conhecer a história da Vinheria Percussi.
Apaixonado pela boa mesa e, particularmente, pelos vinhos, Luciano Percussi - enófilo e autor de três livros sobre o tema e um quarto com previsão de lançamento em novembro - decidiu deixar o ramo industrial e abrir uma adega. Pequena e charmosa, a Vinheria Percussi foi inaugurada em 1985, na rua Joaquim Antunes, também no bairro de Pinheiros, vendendo inclusive algumas garrafas que levavam o rótulo Percussi, produzidas especialmente para Luciano por uma vinícola da Serra Gaúcha. Sua mulher, a assitente social e cozinheira gabaritada Maria Grazia, resolveu fazer uma novidade : sanduíches de metro, que foram copiados à exaustão e hoje podem ser encontrados em qualquer padaria de bairro. Estava dado o primeiro passo para a casa se tornar restaurante. Como o espaço era exíguo - apenas 16 lugares para atender a clientela crescente -, a solução foi mudar para o atual endereço.
Além de Luciano, quem passou a administrar o restaurante foi o filho Lamberto. Foi justamente ele quem convidou a irmã Silvia para "dar uma força', já que nessa época a Vinheria não tinha um cardápio italiano. No almoço, operava um quilo caprichado e,no jantar, alguns pratos da chamada cozinha internacional. "O trato inicial era que eu trabalhasse meio período. No restante do tempo, atuava como decoradora", conta Silvia. Houve então a tal greve de ônibus e não apareceu um único cozinheiro. A solução foi Silvia pilotar o fogão. A partir daí, o restaurante foi tamando conta de sua vida, das 08 da manhã muitas vezes até a madrugada.
Logo a organizadíssima Silvia percebeu que era preciso mais do que disciplina para conduzir a cozinha de um restaurante. Atender a paladares tão distintos exigia domínio das técnicas de cozinha e numa época em que trabalhar à frente de um fogão não tinha o glamour de hoje.
A solução foi se inscrever no curso de Martha Kardos, mestra húngara já falecida cujo talento em ensinar mereceu inclusive um capítulo no saboroso "Não É Sopa", escrito por Nina Horta em 1996. "Dona Martha era bravíssima, rígida em seus ensinamentos", recorda-se Silvia, que durante dois anos frequentou as aulas na casa da professora, ministradas aos sábados. "Adorava. Não perdi nenhuma e fiquei sem viajar aos fins de semana durante esse período."No final do curso, no qual aprendeu a fazer goulash e a tentadora e simplíssima torta de maçã, "receita para ensinar crianças a cozinhar, dizia dona Martha", vitalícia no menu do restaurante, Silvia sabia da necessidade de reposicionar o Vinheria. Junto do irmão Lamberto, um dos restaurateurs mais simpáticos e falantes de São Paulo, Silvia conseguiu imprimir identidade ao restaurante e transformá-lo numa casa italiana. N ansiedade de fazer receitas o mais próximas possível das originais, ela foi fazer cursos no Chiantini e outras regiões italianas. Ingredientes como vitela e cordeiro passaram a estrelar o menu. As massas, de fabricação própria, se transformaram em outros atrativos. São distribuídas inclusive em butiques de gastronomia e supermercados finos como Empório Santa Maria. Outra arma de Silvia para cativar a clientela é criar um visual sedutor para cada um dos pratos. A intimidade com as artes pláticas e o curso de densenho industrial facilitara e muito essa tarefa. Ao mesmo tempo, o trabalho no restaurante foi ficando menos estafante. Ela conseguiu treinar uma afinada equipe que a acompanh há dez anos. "Apesar da baixa escolaridade, todos eles têm aula de italiano duas vezes por semana aqui no restaurante", conta Silvia. Sempre que vai à cozinha, leva um mapa para explicar a origem dos pratos que eles irão preparar. Hoje seu expediente no restaurante se limita a cinco horas, entre 13 e 18 horas. No restaurante do tempo, ela mesma acabou se tornado professora de culinária. Leciona na Universidade Anhembi-Morumbi no Atelier Gourmand e na rede Spicy.
Entre as novidades do festival de cogumelos deste ano, a partir de 15 de outubro somente com receitas inéditas, Silvia desenvolveu um ravióli gigante recheado com shiitake inteiro. Antes de ser envolvido por uma massa finíssima, o fungo é levemente cozido em ervas e alho. "Também não pode faltar vinho branco, que amacia e dá um sabor especial."
A massa com recheio de cogumelo japonês é fina iguaria, daquelas que fazem a gula parecer uma grande virtude.
PAPIOTE DE PEIXE COM COGUMELOS
Rendimento: 4 pessoas
Ingredientes:
4 filés de saint pierre
400g de cogumelos shimeji frescos
2 dentes de alho
1 colher sopa de salsinha picada
2 colheres de sopa de azeite
4 colheres de sopa de vinho branco
1 pimenta vermelha seca picada
sal a gosto
papel para levar ao forno
Para o molho
20 mariscos na casca limpos
1 litro de água
1 buquê garni
1 cebola
1 cenoura
1/4 de xícara de chá de azeite
sal a gost
Modo de fazer:
  1. Numa panela grande, aqueça o azeite e refogue a cebola picada, depois a cenoura picada.
  2. Em seguida, coloque os mariscos, deixando cozinhar por alguns minutos. Cubra com água, coloque o buquê garni, acerte o sal e deixe cozinhar em fogo brando por 40 minutos. Reserve.
  3. Em seguida, refogue os cogumelos numa frigideira com azeite e sal e deixe cozinhar até evaporar toda a água. Reserve.
  4. Tempere cada peixe com meio dente de alho socado, um pouco de salsinha e a pimenta. Em quatro folhas de papel para forno, estenda uma camada de cogumelos e, sobre ela, um filé de peixe. Tempere o peixe com vinho, sal e azeite. Finalize com 2 ou 3 colheres de sopa do caldo mariscos, colocando sobre cada filé 5 mariscos sem casca.
  5. Feche os papiotes e leve ao forno pré-aquecido em 220ºC entre 25 e 40 minutos. Fica ótimo acompanhado de batatas cozidas, gratinadas ou em forme de purê ou com risoto de cogumelos.

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